por Ricardo Garrido
Você deve estar se perguntando, “como assim?, precisa de alguma razão?”
Bem, o leitor tem razão: não assistir a filmes da série Crepúsculo é uma premissa a que qualquer homem com a cabeça no lugar deveria atender. Mas, sabe como é, o cara já tinha visto o primeiro filme, não havia muitas opções no cinema, o horário era adequado, nêgo tem uma certa quedinha pela Kristen Stewart… e, claro, a namorada ou a esposa sugeriu, propôs, exigiu ver o filme. E, numa combinação infeliz de algumas dessas condições, lá fui eu parar na frente da tela que exibia o penúltimo filme da série.
Crepúsculo -- Amanhecer Parte 1 é ruim, muito ruim. Não sei se é o pior da série, porque pulei o segundo filme -- aquele em que os lobos dão as caras. Mas vi o primeiro (que, confesso, achei bacana e dono de uma atmosfera interessante) e o terceiro (que era insuportável). Este quarto filme é pior do que o terceiro. Um inferno.
Edward e Bella: enfim casados, mas a coisa continua difícil de rolar…
Fazer uma análise mais cuidadosa e séria é dedicar a Amanhecer uma atenção e um cuidado que ele não merece. Quer dizer, os caras pegam um best-seller com público cativo e não se empenham em produzir efeitos especiais decentes, ou em arrancar dos seus protagonistas uma atuação um pouco acima do amador. Não sou eu que vou tentar conferir alguma dignidade a essa empreitada doentia.
Mas, para salvar o afortunado leitor de enfrentar tal calvário, enumero abaixo dez razões para não assistir Crepúsculo -- Amanhecer Parte 1.
1- Os caras conseguiram fazer um filme em que a Bella (Kristen Stewart) está feia. O livro exige isso, OK (ela fica grávida do Edward, o vampiro vacilão, e a gestação de um vampirinho sedento não é fácil). Mas isso é cinema, e no cinema as mulheres sempre acordam maquiadas e penteadas. Esse é o espírito da coisa. Ir ao cinema pra ver Kristen toda machucada, manchada e vomitando pelos cantos é trash.
2- A piada do Jacob, o Lobo Mau, furando os olhos do vampiro vacilão já está cansando. Essa tensão fez o sucesso dos dois filmes anteriores, mas já deu. Quando a coisa vira auto-ironia, perde completamente a graça. Neste Amanhecer, Edward leva o Lobo Mau como presente de casamento para Bella -- no próprio casamento! Depois, ela anuncia que “a coisa fica completa” quando os três estão juntos. O cinema ri. Eu não. Se é pra fazer piada interna, eu gostaria mesmo de ver é a Bella parindo um lobinho bonitinho. E a vampirada toda olhando para o Vacilão: “Edward, seu frouxo!”
3- Tenho 36 anos e já vi muitas cenas de casamento (se contar só últimos capítulos de novelas da Globo, devo ter visto umas 200). Mas nunca vi um casamento tão chocho e triste quanto o de Bella e Edward. A moça caminha em direção ao altar como quem está indo para a guilhotina. Eu entendi a proposta do diretor (e isso deve estar muito bem descrito no livro): ela está desconfortável e insegura com toda aquela pompa (que é meia-boca no filme), mas, a partir do momento em que vê Edward, ruma segura para o altar. Bom, a moça não tem tantos recursos dramáticos assim. Eu não vi essa mudança, só a percebi pela música.
4- A tão decantada passagem pelo Rio de Janeiro na lua-de-mel dos noivinhos é, na falta de um adjetivo que expresse toda a sua decrepitude, otária. Eles andam de táxi, descem na Lapa, ouvem um samba ainda mais falso do que o samba das rodinhas “rouba-pouco” que assolam os pontos mais turísticos do Rio, pegam um barquinho e rumam para uma ilha em Angra ou algo assim. Algumas palavras são faladas em português, coisa que arrancou risos altos na sala onde eu vi o filme. Não entendi a graça, pois não eram falas engraçadas, e as pessoas (o vampiro, que é poliglota, entre elas) não falavam de um jeito engraçado. Uma moça olha o casal se beijando e exclama: “NOSSA!” -- e o cinema explode em gargalhadas. Tenho algo a dizer sobre o público de Crepúsculo, mas fica para daqui a pouco.
5- A tão esperada cena de sexo entre Bella, que literalmente implorou por anos por uma transa, e Edward, que refugou e continuou a refugar neste quarto filme, não tem nada de memorável ou forte, como se alardeou por aí. Eles se beijaram, montaram o papai-mamãe (“posição dos missionários”, como se fala mui adequadamente nos EUA) e pronto. Vemos o quarto destruído no dia seguinte, mas é difícil crer que o cara seja exatamente uma máquina de sexo.
6- As cenas de ação são, como é regra nessa série, toscas. Neste filme, não há muita ação, apenas uma briga rápida entre vampiros e lobisomens. Eles chegam, pulam um sobre os outros, dão uns socos nos focinhos e pronto, finito. Não sei explicar direito o que acontece, porque a cena é tão escura, rápida e recortada que não dá pra ver nada. Mais bizarro é o fato de nenhum dos envolvidos em tamanho quebra-pau sofrer qualquer arranhão. Nenhum lobo morde ninguém, nenhum cãozinho é sacrificado. Parece briga de colégio.
7- Para alimentar o feto que cresce dentro dela, Bella toma sangue de canudinho. Isso é escroto. O médico-vampiro diz que é o jeito mais rápido dela absorver o “nutriente”, mas nesse exato momento ela estava com soro sendo injetado diretamente numa veia. Ora, por que não trocaram o saquinho de soro pelo saquinho de sangue? Não cobro que o filme seja verossímil, mas pelo menos tirem o soro dali, para não escancarar a bizarrice!
8- Há uma conferência de lobos, convertidos no formato canino. Eles se reúnem e falam com vozes de Darth Vader, daquelas processadas digitalmente. Parece paródia da cachorrada daquele desenho da Pixar, Up!… Que ponham todos no cone da vergonha!
9- Depois de anos e anos pregando a abstinência sexual para adolescentes, a autora dos livros se põe a advogar contra o aborto. A menina está grávida de um vampiro, o bebê cresceu e está pronto para sair em menos de 2 meses (!), ele é enorme e está quebrando as costelas da moça -- mas não, o aborto não é uma questão. Bella está convicta de que isso é errado, então ela terá o bebê (um monstro? um vampiro? uma aberração?). Mesmo sabendo que a morte é certa. Hora de mandar a autora pentear lobisomens.
10- Por fim, meus amigos, é importante que sejam evitados contatos mais prolongados com o público-torcedor dessa série. É uma turma estranha: vejo jovens adultos (adultas, na verdade) ocupando o cinema e suspirando quando aparece o tal do Edward (um cara que, como já escrevi anteriormente, concentra todas suas forças em ser um retrato unidimensional do cruzamento entre James Dean e o Dylan, de Barrados no Baile). Rindo e comentando quando aparece o Lobo Mau sem camisa. Gargalhando quando alguém fala em português. Suspirando quando aparece o bebê envolto em sangue. É tudo muito esquisito. Não quero acusar ninguém de nada, mas repudio uma série de livros que vive de satanizar o sexo para adolescentes. E quem elege isso a coisa mais bacana do mundo, a meu ver, tem alguns problemas.
E quando vier o Amanhecer -- Parte 2? Será que Bella vai aparecer toda radiante, vestida de preto e com aqueles olhos vermelhos que fecham o filme? Penso na Olivia Newton-John na última cena de Grease, e gosto disso. Mas não acredito que agora a moça vá chutar rabos. Ela já atravessou toda sua adolescência sendo moralmente mutilada pela ética zero a zero do Vampiro Vacilão e da sua criadora. Ela transou uma única vez, e acabou parindo um monstrinho que lhe sugou literalmente a vida. Coitada da Bella. Ela merecia melhor sorte.
--- Ricardo Garrido é um blogueiro do site da VIP, só escreve sobre cinema. Resolvi colar esse texto aqui no Clube da VIP por simplesmente concordar 100% com ele. Os textos dele são ótimos, vale conferir o blog todo, é só clicar aqui..
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